domingo, 6 de junho de 2010

Projeto de Educação: a crença !

Muito complicado pensar um PROJETO DE EDUCAÇÃO ou ainda esperar uma mudança a médio ou longo prazo de um sonho nacional pautado na educação.
A proposta de um projeto educacional apresentado pela LDB e seus diversos adicionais que orientavam condições deste projeto de educacação não conseguiram ganhar força em curto prazo e a médio prazo (período, que penso, estarmos vivenciando). Hoje podemos sinalizar e constatar um aumento de visibilidade e uma urgência de realização (diversos programas de avaliações, proposta do novo Enem e principalmente forma de acesso ao ensino superior)deste caminho ou projeto de educação.Mas a sensação e os dados nos forçam a dizer que precisamos buscar e construir muitas propostas.
Esta minha leitura é reforçada e alicerçada por elementos como a não leitura ou formação de estudos deste projeto por grande parte das instituições de formação de educadores em seus mais diversificados níveis e formas. Não chegou ainda nos bancos, mentes e discursos acadêmicos, e principalmente na cultura de formação do ensino superior, uma adesão a este projeto. Nossos educadores saem sem conhecer ou se aprofundar os elementos presentes neste projeto. Quantos são os professores que ouviram, leram, se prepararam para a avaliação em sistema TRI (Teoria de Resposta ao Ítem)?
Se esta sensação já era explícita, ela é aumentada principalmente por dados que pesquisas com professores nos ajudam a reforçar. Como pensar num projeto, numa transformação nacional, a partir de novos pressupostos (interdisciplinariedade, contextualização, fuga da especialização, problematização) se não temos número adequado de professores (nem para atender a demanda de um projeto antigo por disciplina).
Fica aqui, antes de tudo, a inquietação e o convite para pensarmos a Educação com mais seriedade e veracidade. Utilizando da teoria de Austin, pensar uma Educação como possibilidade de ser mais "feliz".

- P.S.: abaixo reportagem sobre defasagem de professores.

Meio milhão de docentes dá aulas sem formação ideal
Censo escolar divulgado pelo Inep considera apenas a inadequação dos professores que já possuem diploma de curso superior

Priscilla Borges, iG Brasília, e Carolina Rocha, iG São Paulo
02/06/2010 19:39

Meio milhão de professores da educação básica ensina, nas salas de aulas da rede pública brasileira, disciplinas sobre as quais não aprenderam durante o curso superior. Nos mais variados colégios brasileiros, profissionais formados em matemática dão aulas de física e professores de educação física dão aulas de biologia, por exemplo. Eles representam quase um quarto dos 1.977.978 educadores dessa etapa.

Dados do Censo Escolar 2009 tabulados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revelam que pouco mais da metade (53,3%) dos professores que atuam no ensino médio na rede pública têm formação compatível com a disciplina que lecionam. O total é de 366.757. Nas séries finais do ensino fundamental, etapa na qual as matérias começam a ser dadas por professores de áreas específicas, a proporção é ainda menor: 46,7% de 617.571 docentes.

O levantamento feito pelo Inep considerou apenas a inadequação dos professores que já possuem diploma de curso superior. A quantidade de docentes que atua nos colégios brasileiros sem ter freqüentado uma universidade também é grande: 152 mil, como divulgou o iG. Os números revelam que a maior distorção está na área de exatas, na qual os profissionais formados nos cursos de licenciatura do País são insuficientes para suprir a demanda.

Leia também

* Professores "leigos" crescem 35% em dois
* Maioria dos professores “leigos” está no Nordeste
* De dez docentes, dois atuam em mais de uma escola
* Professor: carreira pouco atraente
* Universidades públicas formam mais professores

Segundo o censo, nas séries finais do ensino fundamental, apenas 5% dos professores de física têm licenciatura na área. Em química, apenas 10,4% dos docentes têm formação adequada. Em biologia, 16,4%. Mesmo em língua portuguesa, a disciplina dessa fase que mais possui professores com formação adequada para o ensino da matéria, os qualificados não passam de 65% do quadro de profissionais da área.

No ensino médio, as áreas que “lideram” as estatísticas da inadequação entre diploma universitário e matéria dada em sala de aula são um pouco diferentes do fundamental. Além da física, em que apenas 25,1% dos docentes que lecionam a disciplina têm formação na área, em química, 28% dos profissionais dão aulas sem qualificação adequada. Faltam também professores especialistas de língua estrangeira e de educação artística, por exemplo.
(reportagem completa em http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/meio+milhao+de+docentes+da+aulas+sem+formacao+ideal/n1237653160064.html)

Relações entre família e escola - categorias

Abrigo de tensões

As relações entre família e escola nunca foram tão próximas, mas se ressentem das diferenças de lógica entre as duas instituições

Maria Alice Nogueira e Maria José Braga Viana
http://www.ondajovem.com.br/materiadet.asp?idtexto=305

Nos dias atuais, a família e a escola constituem os dois espaços principais de socialização das novas gerações. É sobretudo por meio dessas duas instituições que os jovens de hoje constroem sua identidade, formam seus valores e preparam-se para a vida adulta, em particular a vida profissional.

O estudo das relações entre essas duas esferas da vida social vem se desenvolvendo lentamente, mas apresentando resultados de pesquisa que começam a se consolidar. Talvez o maior deles resida numa dupla constatação: a) de que família e escola nunca mantiveram relações tão próximas e intensas quanto na atualidade; b) de que há hoje uma forte disseminação – tanto nos meios educacionais, quanto na opinião pública – da crença de que esses dois agentes precisam estabelecer uma sólida parceria e colaboração, para que não haja incongruências entre as práticas e os processos educativos desenvolvidos em cada uma dessas duas instâncias.

No entanto, se este último pressuposto se assenta numa racionalidade lógica, ele desconhece a razão socio(lógica) que faz a socialização familiar – que se diferencia de um meio social a outro – dotar a criança e o jovem de instrumentos (cognitivos e comportamentais) diversificados e mais ou menos adaptados às exigências implícitas ou explícitas do sistema escolar.

Assim, ao investigar as relações que as famílias populares mantêm com a escola, o pesquisador depara com um fato marcante: os contrastes ou as dissonâncias existentes entre o modo de socialização que rege o universo pedagógico das escolas e aquele que vigora no universo doméstico das famílias populares.
Lógicas distintas

Mesmo considerando que as famílias populares apresentam diferenças entre si e que elas não constituem, portanto, um todo homogêneo, estudos sociológicos recentes vêm identificando lógicas que marcam o seu modo de socializar e que têm um forte impacto sobre a escolarização dos filhos, dentre elas: os sentidos atribuídos à escola, as posturas corporais e os comportamentos desenvolvidos, as disposições temporais construídas.

Em primeiro lugar, o sentido atribuído à escolaridade dos filhos orienta-se especialmente pela lógica da eficácia. Para os pais, as aprendizagens escolares devem culminar em trunfos profissionais que possibilitem que os jovens “se virem” na vida e escapem das dificuldades vividas por eles. A escolarização dos filhos é, por conseguinte, carregada de expectativas de ascensão social, ainda que, muitas vezes, a ambição escolar seja modesta, não ultrapassando a conclusão do ensino médio. Por não possuírem (ou não sentirem que possuem) as condições culturais necessárias para compreender o universo pedagógico e para monitorar a escolaridade dos filhos – como fazem, com regularidade, as classes médias –, as atenções e atitudes parentais concentram-se nos resultados escolares imediatos: a nota, a promoção de uma série ou ciclo a outro, etc. O problema é que, de modo geral, a lógica escolar se inscreve na longa duração e inferioriza as aprendizagens meramente utilitárias (para passar de ano, tirar o diploma, etc.), em favor do conhecimento desejado por si mesmo, como forma de enriquecimento intelectual do indivíduo.

Em segundo lugar, o confronto entre certas exigências comportamentais da escola (consideradas como condição para a efetivação das atividades cognitivas) e as disposições corporais produzidas pelas condições de existência próprias dos meios populares. A escola exige dos alunos um corpo “disciplinado”, “disposto” de determinada forma. Eles devem permanecer assentados em ”seu” lugar, ter uma postura de escuta e de registro das aulas, responder às solicitações de forma e em momentos estabelecidos, etc. Tudo isso pressupõe controle sobre si mesmo, autodisciplina e concentração; posturas que são desigualmente repartidas entre os indivíduos dos diferentes grupos sociais. Os estudos têm apontado que essas posturas corporais representam constrangimentos para as camadas populares, porque não encontram lastro em sua socialização familiar. Os jovens desses meios – sobretudo as crianças – adotam, em sala de aula, posturas de grande mobilidade física ou de apatia, ambas resultantes de uma reação ao contexto da atividade escolar, que requer disposições distantes daquelas criadas em seu universo de origem.

Um terceiro fator é constituído pelo distanciamento entre famílias populares e escola no âmbito das temporalidades. Nas famílias populares, em especial no caso daquelas que enfrentam extrema precariedade econômica, vivencia-se uma temporalidade linear e arrítmica; o tempo se desenrola sem escansão; os eventos da vida acontecem freqüentemente sob o signo da urgência, o que dificulta ou impossibilita a previsibilidade e a planificação. A socialização familiar, nesse contexto, caracteriza-se por um frágil enquadramento do tempo dos filhos, como os horários de estudo, de refeições, de ver televisão, de dormir, etc. Já no universo da escola, o que prevalece é: a regularidade temporal (horários e calendários escolares, sucessão de atividades pedagógicas organizadas no tempo); a lógica da planificação das aprendizagens, materializada, por exemplo, no uso da agenda e no recurso às reuniões entre professores e pais.

Se as temporalidades existentes no universo escolar e no universo das famílias populares divergem, a interdependência entre essas diferentes lógicas torna-se potencialmente produtora de contradições. Com efeito, estudos que têm buscado identificar condições possibilitadoras de sucesso escolar em meios populares vêm concluindo que determinadas disposições em face do futuro mostram-se mais favorecedoras do êxito na escola. São disposições caracterizadas pela extensão de horizontes, pela tomada de distância em relação ao presente, pela possibilidade (subjetiva e objetiva) de construção de projetos de vida.

Em suma, da perspectiva dos modos de socialização, as relações entre as famílias populares e a instituição escolar se caracterizam por um confronto desigual, tenso e potencialmente constitutivo de dificuldades para professores e famílias. Dificuldades que, com certeza, seriam minimizadas se conseguíssemos tornar as lógicas socializatórias populares mais visíveis e mais inteligíveis aos olhos de boa parte dos professores e outros profissionais da educação escolar.
Sobre as autoras

Maria Alice Nogueira é professora-titular da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Doutora em Educação pela Universidade de Paris V, é autora de livros como “Família & Escola – Trajetórias de Escolarização em Camadas Médias e Populares” (Vozes, 2000, em co-autoria com G. Romanelli e N. Zago) e “A Escolarização das Elites” (Vozes, 2002, em co-autoria com A. Almeida).

Maria José Braga Viana é professora-adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Doutora em Educação pela FaE/UFMG, é autora do livro “Longevidade Escolar em Famílias Populares” (Ed. da Universidade Católica de Goiás, 2007).

Arquivo do blog